03 fevereiro 2008

As Religiões - A Doutrina Secreta - 2



"Se, do domínio dos factos, passarmos ao dos princípios, teremos de esboçar desde logo as grandes linhas da doutrina secreta. Ao ver desta, a vida não é mais que a evolução, no tempo e no espaço, do Espírito, única realidade permanente. A matéria é sua expressão inferior, sua forma variável.

O Ser por excelência, fonte de todos os seres, é Deus, simultaneamente triplo e uno – essência, substância e vida –, em que se resume todo o Universo. Daí o deísmo trinitário que, da Índia e do Egipto, passou, desfigurando-se, para a doutrina cristã. Esta, dos três elementos do Ser, fez as pessoas.

A alma humana, parcela da grande alma, é imortal. Progride e sobe para o seu autor através de existências numerosas, alternativamente terrestres e espirituais, por um aperfeiçoamento contínuo. Em suas encarnações, constitui ela o homem, cuja natureza ternária – o corpo, o perispírito e a alma –, centros correspondentes da sensação, sentimento e conhecimento, torna-se um microcosmo ou pequeno mundo, imagem reduzida do macrocosmo ou Grande-Todo. Eis por que podemos encontrar Deus no mais profundo do nosso ser, interrogando a nós mesmos na solidão, estudando e desenvolvendo as nossas faculdades latentes, a nossa razão e consciência.

Tem duas faces a vida universal: a involução ou descida do Espírito à matéria para a criação individual, e a evolução ou ascensão gradual, na cadeia das existências, para a Unidade divina.


(…) Este ensino abria ao pensamento perspectivas susceptíveis de causarem vertigem aos espíritos mal preparados, e por isso era somente reservado aos fortes. Se, por verem o infinito, as almas débeis ficam perturbadas e desvairadas, as valentes fortificam-se e medram. É no conhecimento das leis superiores que estas vão beber a fé esclarecida, a confiança no futuro, a consolação na desgraça. Tal conhecimento produz benevolência para com os fracos, para com todos esses que se agitam ainda nos círculos inferiores da existência, vítimas das paixões e da ignorância; inspira tolerância para com todas as crenças. O iniciado sabia unir-se a todos e orar com todos. Honrava Brahma na Índia, Osíris em Mênfis, Júpiter na Olímpia, como pálidas imagens da Potência Suprema, directora das almas e dos mundos. É assim que a verdadeira religião se eleva acima de todas as crenças e a nenhuma maldiz.

O ensino dos santuários produziu homens realmente prodigiosos pela elevação de vistas e pelo valor das obras realizadas, uma elite de pensadores e de homens de acção, cujos nomes se encontram em todas as páginas da História. Daí saíram os grandes reformadores, os fundadores de religiões, os ardentes propagandistas: Krishna, Zoroastro, Hermes, Moisés, Pitágoras, Platão e Jesus; todos os que têm posto ao alcance das multidões as verdades sublimes que fazem sua superioridade. Lançaram aos ventos a semente que fecunda as almas, promulgaram a lei moral, imutável, sempre e em toda parte semelhante a si mesma.

Mas, não souberam os discípulos guardar intacta a herança dos mestres. Mortos estes, os seus ensinos ficaram desnaturados e desfigurados por alterações sucessivas. A mediocridade dos homens não era apta a perceber as coisas do espírito e bem depressa as religiões perderam a sua simplicidade e pureza primitivas. As verdades que tinham sido ensinadas foram sufocadas sob os pormenores de uma interpretação grosseira e material. Abusou-se dos símbolos para chocar a imaginação dos crentes e, muito breve, a ideia mater ficou sepultada e esquecida sob eles. (…) O que nos vem de cima mancha-se ao contacto terrestre. Até mesmo ao seio dos templos levou o homem as suas concupiscências e misérias morais.

Por isso, em cada religião, o erro, este apanágio da Terra, mistura-se com a verdade, este bem dos céus."

(Léon Denis, "Après la Mort", 1889)

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