08 junho 2008

Budismo - 2


A maior parte das religiões recomenda-nos fazer o bem em vista de uma recompensa de além-túmulo. Está aí um móbil egoísta e mercenário que não se encontra do mesmo modo no Budismo. É necessário praticar o bem, porque o bem é o fim supremo da Natureza. É conformando-se às exigências dessa lei que se adquire a única satisfação verdadeira, a mais bela que pode apreciar o ser desprendido dos entraves da forma e das atracções do desejo, causas contínuas de decepção e de sofrimento.

A compaixão do Budismo, sua caridade, estende-se a todos os seres. Segundo ele, todos são destinados ao Nirvana. E, por seres, devem entender-se os animais, os vegetais e mesmo os corpos inorgânicos. Todas as formas da vida se encadeiam, de acordo com a lei grandiosa da evolução e do transformismo. Em parte alguma do universo deixa de existir vida.

A morte não é senão uma ilusão, um dos agentes da vida que exige um renovamento contínuo e transformações incessantes. O inferno, para os iniciados na doutrina, não é outra coisa senão o remorso e a ausência do amor. O purgatório está em toda parte onde se encontra a forma e onde evoluciona a matéria. Está em nosso globo, ao mesmo tempo em que nas profundezas do firmamento estrelado.

O Buddha e seus discípulos praticavam o Diana, ou a contemplação, o êxtase. Durante esse estado, o Espírito destaca-se e comunica-se com as almas que deixaram a Terra.

O Budismo esotérico ou vulgar, repelido de todos os lados da Índia no século VI, após lutas sangrentas provocadas pelos brâmanes, sofreu vicissitudes diversas e numerosas transformações. Um dos seus ramos ou Igreja, a do Sul, em algumas das suas interpretações, parece inclinar-se para o ateísmo e materialismo. A do Tibete conservou-se deísta e espiritualista. O Budismo também se tornou a religião do império mais vasto do mundo: a China. Seus fiéis adeptos compõem, hoje, a terça parte da população do globo; mas, em todos os meios onde ele se espalhou, do Ural ao Japão, foram veladas e alteradas as tradições primitivas. Nele, como em qualquer outra doutrina, as formas materiais do culto abafaram as altas aspirações do pensamento. Os ritos, as cerimónias supersticiosas, as fórmulas vãs, as oferendas, as preces sonoras, substituíram o ensino moral e a prática das virtudes. Entretanto, os principais ensinamentos do Buddha foram conservados nos Sutras. Sábios, herdeiros da ciência e dos poderes dos antigos ascetas, possuem também, dizem, a doutrina secreta na sua integridade. Esses estabeleceram suas moradas longe das multidões humanas, sobre os planaltos das montanhas, de onde os campos da Índia apenas se divisam vagos e longínquos como num sonho. É na atmosfera pura e calma das solidões que habitam os Mãhãtmas. Possuindo segredos que lhes permitem desafiar a dor e a morte, passam os dias na meditação, esperando a hora problemática em que o estado moral da Humanidade torne possível a divulgação dos seus poderes extraordinários. Como, porém, nenhum facto bastante autêntico tem vindo até hoje confirmar essas citações, ainda fica por provar a existência dos Mãhãtmas.

Grandes esforços foram empregados para espalhar a doutrina búdica no Ocidente. A raça latina, porém, ávida de movimento, de luz e liberdade, parece pouco disposta a assimilar-se a essa religião de renúncia, de que os povos orientais fizeram uma doutrina de aniquilamento voluntário e de prostração intelectual. O Budismo, na Europa, apenas tem permanecido no domínio de alguns homens de letras, que honram o esoterismo tibetano. Este, em certos pontos, abre ao Espírito humano perspectivas estranhas. A teoria dos dias e das noites de BrahmaManvantara e Pralaya –, que é uma renovação das antigas religiões da Índia, parece que está em muita contradição com a ideia do Nirvana. De qualquer modo, esses períodos imensos de difusão e concentração, durante os quais a grande causa primordial absorve todos os seres, permanece só, imóvel, adormecida sobre os mundos dissolvidos, atraem o pensamento numa espécie de vertigem. A teoria dos sete princípios constitutivos do homem e dos sete planetas, sobre os quais corre a roda da vida num movimento ascensional, também constitui pontos originais e sujeitos a exame.

Uma coisa domina este ensino: é a lei de caridade proclamada pelo Buddha – um dos mais poderosos apelos ao bem que tem ecoado neste mundo –; mas, segundo a expressão de Léon de Rosny, “essa lei calma e pura, porque nada traz em seu apoio, ficou ininteligível para a maioria dos homens, visto lhes revoltar os apetites e não prometer a espécie de salário que querem ganhar”.

O Budismo, apesar das suas manchas e sombras, nem por isso deixa de ser uma das maiores concepções religiosas das que têm aparecido neste mundo, uma doutrina toda de amor e igualdade, uma reacção poderosa contra a distinção de castas que foi estabelecida pelos brâmanes, doutrina que, em certos pontos, oferece analogias importantes com o Evangelho de Jesus de Nazaré.


(Léon Denis - Depois da Morte)

Budismo - 1



Cerca de seiscentos anos antes da era Cristã, um filho de rei, Çãkyamuni (Siddhartha Gautama) ou o Buddha (O Iluminado), foi acometido de profunda tristeza e imensa piedade pelos sofrimentos dos homens. A corrupção invadira a Índia, logo depois de alteradas as tradições religiosas, e, em seguida, vieram os abusos da teocracia ávida do poder. Renunciando às grandezas, à vida faustosa, o Buddha deixa o seu palácio e embrenha-se na floresta silenciosa. Após longos anos de meditação, reaparece para levar ao mundo asiático senão uma crença nova, ao menos uma outra expressão da Lei.

Segundo o Budismo, está no desejo a causa do mal, da dor, da morte e do renascimento. É o desejo, é a paixão que nos prende às formas materiais e que desperta em nós mil necessidades sem cessar, reverdejantes e nunca saciadas, tornando-se assim, outros tantos tiranos. O fim elevado da vida é arrancar a alma aos turbilhões do desejo. Consegue-se isso pela reflexão, austeridade, pelo desprendimento de todas as coisas terrenas, pelo sacrifício do eu, pela isenção do cativeiro egoísta da personalidade.

A ignorância é o mal soberano de que decorrem o sofrimento e a miséria; o principal meio para se melhorar a vida no presente e no futuro é adquirir-se o conhecimento. O conhecimento compreende a ciência da natureza visível e invisível, o estudo do homem e dos princípios das coisas. Estes são absolutos e eternos.

O mundo, saído por sua própria actividade de um estado uniforme, está numa evolução contínua. Os seres, descidos do Grande-Todo a fim de operarem o problema da Perfeição, inseparável do estado de liberdade e, por conseguinte, do movimento e do progresso, tendem sempre a voltar ao Bem perfeito. Não penetram no mundo da forma senão para trabalharem no complemento da sua obra de aperfeiçoamento e elevação. Podem realizar isso pela Ciência, ou Upanishaci, e completá-lo pelo Amor, ou Purana. A Ciência e o Amor são dois factores essenciais do Universo. Enquanto não adquire o amor, o ser está condenado a prosseguir na série das reencarnações terrestres.

Sob a influência de tal doutrina, o instinto egoísta vê estreitar-se pouco a pouco o seu circulo de acção. O ser aprende a abraçar num mesmo amor tudo o que vive e respira; e isto nada mais é que um dos degraus da sua evolução, pois esta deve conduzi-lo a só amar o eterno princípio de que emana todo o amor, e para onde todo ele deve necessariamente voltar.

Esse estado é o do NIRVANA.

Essa expressão, diversamente comentada, tem causado muitos equívocos. Em conformidade com a doutrina secreta do Budismo, o Nirvana não é, como ensina a Igreja do Sul e o Grã-Sacerdote do Ceilão, a perda da individualidade e o esvaecimento do ser no nada, mas sim a conquista, pela alma, da perfeição, e a libertação definitiva das transmigrações e dos renascimentos no seio das humanidades.

Cada qual executa o seu próprio destino. A vida presente, com suas alegrias e dores, não é senão a consequência das boas ou más acções operadas livremente pelo ser nas existências anteriores. O presente explica-se pelo passado, não só para o mundo tomado em seu conjunto, como também para cada um dos seres que o compõem.

Designa-se por CARMA toda a soma de méritos ou de deméritos adquiridos pelo ser. O Carma é para este, em todos os instantes da sua evolução, o ponto de partida do futuro, o motor de toda a justiça distributiva: “Em Buddha uno-me à dor de todos os meus irmãos e, entretanto, sorrio e sinto-me contente porque vejo que a liberdade existe. Sabei, ó vós que sofreis; mostro-vos a verdade; tudo o que somos é resultante do que fomos no passado. Tudo é fundado sobre nossos pensamentos; tudo é obra dos próprios pensamentos. Se as palavras e acções de um homem obedecem a um pensamento puro, a liberdade segue-o como uma sombra. O ódio jamais foi apaziguado pelo ódio, pois não é vencido senão pelo amor. Assim como a chuva passa através de uma casa mal coberta, assim a paixão atravessa um espírito pouco reflectido. Pela reflexão, moderação e domínio de si próprio, o homem transforma-se numa rocha que nenhuma tempestade pode abater. O homem colhe aquilo que semeou. Eis a doutrina do Carma.”


(Léon Denis - Depois da Morte)

01 junho 2008

Krishna (Os Vedas - 3)




Krishna, rodeado por um certo número de discípulos, ia de cidade em cidade espalhar os seus ensinos:

“O corpo – dizia ele –,
envoltório da alma, que aí faz sua morada, é uma coisa finita; porém, a alma que o habita é invisível, imponderável e eterna.
“O destino da alma depois da morte constitui o mistério dos renascimentos. Assim como as profundezas do céu se abrem aos raios dos astros, assim também os recônditos da vida se esclarecem à luz desta verdade.
“Quando o corpo entra em dissolução, se a pureza é que o domina, a alma voa para as regiões desses seres puros que têm o conhecimento do Altíssimo. Mas, se é dominado pela paixão, a alma vem de novo habitar entre aqueles que estão presos às coisas da Terra. Assim, a alma, obscurecida pela matéria e pela ignorância, é novamente atraída para o corpo de seres irracionais.
“Todo renascimento, feliz ou desgraçado, é conseqüência das obras praticadas nas vidas anteriores.
“Há, porém, um mistério maior ainda. Para atingir a perfeição, cumpre conquistar a ciência da Unidade, que está acima de todos os conhecimentos; é preciso elevar-se ao Ser divino, que está acima da alma e da inteligência. Esse Ser divino está também em cada um de nós:
“Trazes em ti próprio um amigo sublime que não conheces, pois Deus reside no interior de todo homem, porém poucos sabem achá-lo. Aquele que faz o sacrifício de seus desejos e de suas obras ao Ser de que procedem os princípios de todas as coisas, obtém por tal sacrifício a perfeição, porque, quem acha em si mesmo sua felicidade, sua alegria, e também sua luz, é um com Deus. Ora, fica sabendo, a alma que encontrou Deus está livre do renascimento e da morte, da velhice e da dor, e bebe a água da imortalidade.”

Krishna falava na sua missão e da sua própria natureza em termos sobre os quais convém meditar. Dirigindo-se aos seus discípulos, dizia:

“Tanto eu como vós temos tido vários nascimentos. Os meus só de mim são conhecidos, porém vós nem mesmo os vossos conheceis. Posto que, por minha natureza, eu não esteja sujeito a nascer e a morrer, todas as vezes que no mundo declina a virtude, e que o vício e a injustiça a superam, torno-me então visível; assim me mostro, de idade em idade, para salvação do justo, para castigo do mau, e para restabelecimento da verdade.
“Revelei-vos os grandes segredos. Não os digais senão àqueles que os podem compreender. Sois os meus eleitos: vedes o alvo, a multidão só descortina uma ponta do caminho.”


Por essas palavras a doutrina secreta estava fundada. Apesar das alterações sucessivas que teve de suportar, ela ficará sendo a fonte da vida em que, na sombra e no silêncio, se inspiram todos os grandes pensadores da antiguidade.

A moral de Krishna também era muito pura:


“Os males com que afligimos o próximo perseguem-nos, assim como a sombra segue o corpo. – As obras inspiradas pelo amor dos nossos semelhantes são as que mais pesarão na balança celeste. – Se convives com os bons, teus exemplos serão inúteis; não receeis habitar entre os maus para os reconduzir ao bem. – O homem virtuoso é semelhante a uma árvore gigantesca, cuja sombra benéfica permite frescura e vida às plantas que a cercam.”

Sua linguagem elevava-se ao sublime quando falava da abnegação e do sacrifício:

“O homem de bem deve cair aos golpes dos maus como o sândalo que, ao ser abatido, perfuma o machado que o fere.”

Quando os sofistas pediam que explicasse a natureza de Deus, respondia-lhes:

“Só o infinito e o espaço podem compreender o infinito. Somente Deus pode compreender a Deus.”

Dizia ainda:

“Nada do que existe pode perecer, porque tudo está contido em Deus. Visto isso, não é alvitre sábio chorarem-se os vivos ou os mortos, pois nunca todos nós cessaremos de subsistir além da vida presente.”

Sobre a comunicação dos Espíritos:

“Muito tempo antes de se despojarem de seu envoltório mortal, as almas que só praticaram o bem adquirem a faculdade de conversar com as almas que as precederam na vida espiritual.”

É isto o que, ainda em nossos dias, afirmam os brâmanes pela doutrina dos Pitris, mesmo porque, em todos os tempos, a evocação dos mortos tem sido uma das formas da sua liturgia.

Tais são os principais pontos dos ensinos de Krishna, que se encontram nos livros sagrados conservados ainda nos santuários do sul do Indostão.

Bhagavad-Gita (Mahabhãrata).

Srimad Bhagavatam.



(Léon Denis - Depois da Morte)

31 maio 2008

Os Vedas - 2



A princípio, a organização social da Índia foi calcada pelos brâmanes sobre suas concepções religiosas. Dividiram a sociedade em três classes, segundo o sistema ternário; mas, pouco a pouco, tal organização degenerou em privilégios sacerdotais e aristocráticos. A hereditariedade impôs os seus limites estreitos e rígidos às aspirações de todos. A mulher, livre e honrada nos tempos védicos, tornou-se escrava, e dos filhos só soube fazer escravos, igualmente. A sociedade condensou-se num molde implacável, a decadência da Índia foi a sua conseqüência inevitável. Petrificado em suas castas e seus dogmas, esse país teve um sono letárgico, imagem da morte, que nem mesmo foi perturbado pelo tumulto das invasões estrangeiras! Acordará ainda? Só o futuro poderá dizê-lo.

Os brâmanes, depois de terem estabelecido a ordem e constituído a sociedade, perderam a Índia por excesso de compressão. Assim também, despiram toda a autoridade moral da doutrina de Krishna, envolvendo-a em formas grosseiras e materiais.

Se considerarmos o Bramanismo somente pelo lado exterior e vulgar, por suas prescrições pueris, cerimonial pomposo, ritos complicados, tábulas e imagens de que é tão pródigo, seremos levados a nele não ver mais que um acervo de superstições. Seria, porém, erro julgá-lo unicamente pelas suas aparências exteriores.

No Bramanismo, como em todas as religiões antigas, cumpre distinguir duas coisas:
- Uma é o culto e o ensino vulgar, repletos de ficções que cativam o povo, auxiliando a conduzi-lo pelas vias da submissão. A esta ordem de idéias liga-se o dogma da metempsicose ou renascimento das almas culpadas em corpos de animais, insetos ou plantas, espantalho destinado a atemorizar os fracos, sistema hábil imitado pelo Catolicismo quando concebeu os mitos de Satanás, do inferno e dos suplícios eternos;
- A outra é o ensino secreto, a grande tradição esotérica que fornece sobre a alma e seus destinos, e sobre a causa universal, as mais puras e elevadas reflexões. Para conseguir isso, é necessário penetrar-se nos mistérios dos pagodes, folhear os manuscritos que estes encerram e interrogar os brâmanes sábios.


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Cerca de seiscentos anos antes da era Cristã, um filho de rei, Çãkyamuni ou o Buddha, foi acometido de profunda tristeza e imensa piedade pelos sofrimentos dos homens. A corrupção invadira a Índia, logo depois de alteradas as tradições religiosas, e, em seguida, vieram os abusos da teocracia ávida do poder. Renunciando às grandezas, à vida faustosa, o Buddha deixa o seu palácio e embrenha-se na floresta silenciosa. Após longos anos de meditação, reaparece para levar ao mundo asiático senão uma crença nova, ao menos uma outra expressão da Lei.


(Léon Denis - Depois da Morte)

Os Vedas - 1



Em "O Espiritismo ou Faquirismo Ocidental", Paul Gibier escreve que a idade dos Vedas ainda não pôde ser fixada, embora Souryo-Shiddanto, um astrônomo hindu cujas observações sobre a posição e percurso das estrelas remonta a cinquenta e oito mil anos, fale dos Vedas como obras já veneráveis pela sua antiguidade.

Os hinos védicos igualam em grandeza e elevação moral a tudo o que, no decorrer dos tempos, o sentimento poético engendrou de mais belo.

Celebram Agni, o fogo, símbolo do Eterno Masculino ou Espírito Criador; Sorna, o licor do sacrifício, símbolo do Eterno Feminino, Alma do Mundo, substância etérea. Em sua união perfeita, esses dois princípios essenciais do Universo constituem o Ser Supremo, Zians ou Deus. O Ser Supremo imola-se a si próprio e divide-se para produzir a vida universal. Assim, o mundo e os seres saídos de Deus voltam a Deus por uma evolução constante. Daí a teoria da queda e da reascensão das almas que se encontra no Oriente.

Ao sacrifício do fogo resume-se todo o culto védico. Ao levantar do dia, o chefe de família, pai e sacerdote ao mesmo tempo, acendia a chama sagrada no altar da Terra e, assim, para o céu azul, subia alegre a prece, a invocação de todos à Força única e viva, que está coberta pelo véu transparente da Natureza. Enquanto se cumpre o sacrifício, dizem os Vedas, os Assuras ou Espíritos superiores e os Pitris ou almas dos antepassados cercam os assistentes e se associam às suas preces. Portanto, a crença nos Espíritos remonta às primeiras idades do mundo.

Os Vedas afirmam a imortalidade da alma e a reencarnação:
“Há uma parte imortal do homem que é aquela, o Agni, que cumpre aquecer com teus raios, inflamar com teus fogos. – De onde nasceu a alma? Umas vêm para nós e daqui partem, outras partem e tornam a voltar.”

Os Vedas são monoteístas; as alegorias que se encontram em cada página apenas dissimulam a imagem da grande Causa primária, cujo nome, cercado de santo respeito, não podia, sob pena de morte, ser pronunciado. As divindades secundárias ou devas personificam os auxiliares inferiores do Ser Supremo, as forças vivas da Natureza e as qualidades morais.

Do ensino dos Vedas decorria toda a organização da sociedade primitiva, o respeito à mulher, o culto dos antepassados, o poder eletivo e patriarcal. Os homens viviam felizes, livres e em paz.

Durante a época védica, na vasta solidão dos bosques, nas margens dos rios e lagos, anacoretas ou rishis passavam os dias no retiro. Intérpretes da ciência oculta, da doutrina secreta dos Vedas, eles possuíam já esses misteriosos poderes, transmitidos de século em século, de que gozam ainda os faquires e os jogues. Dessa confraria de solitários saiu o pensamento inovador, o primeiro impulso que fez do Bramanismo a mais colossal das teocracias.

Krishna, educado pelos ascetas no seio das florestas de cedros que coroam os píncaros nevoentos do Himalaia, foi o inspirador das crenças dos hindus. Essa grande figura aparece na História como o primeiro dos reformadores religiosos, dos missionários divinos. Renovou as doutrinas védicas, apoiando-se sobre as idéias da Trindade, da imortalidade da alma e de seus renascimentos sucessivos. Selada a obra com o seu próprio sangue, deixou a Terra, legando à Índia essa concepção do Universo e da Vida, esse ideal superior em que ela tem vivido durante milhares de anos.

Sob nomes diversos, pelo mundo espalhou-se essa doutrina com todas as migrações de homens, de que foi origem a região da Índia. Essa terra sagrada não é somente a mãe dos povos e das civilizações, é também o foco das maiores inspirações religiosas.

(Léon Denis - Depois da Morte)

22 maio 2008

Franz Anton Mesmer


Mesmer, médico austríaco, foi o criador da "Teoria do Magnetismo Animal", conhecida pelo nome de "Mesmerismo".

Nasceu no dia 23 de Maio de 1734, numa pequena vila perto do Lago Constance, de nome Iznang. Estudou teologia em Ingolstadt e formou-se em medicina na Universidade de Viena. Na posse de abastados recursos económicos, Mesmer pôde dedicar-se a longos estudos científicos, chegando a dominar os conhecimentos de seu tempo, época de acentuado orgulho intelectual e cepticismo. Era um trabalhador incansável, calmo, paciente e ainda um excelente músico.

Em 1775, após muitas experiências, Mesmer reconhece que pode curar mediante a aplicação de suas mãos, percebendo pelos dons da intuição que delas se desprende um fluido que alcança o doente.

"De todos os corpos da Natureza, é o próprio homem que com maior eficácia actua sobre o homem", afirma Mesmer, adivinhando que a doença é apenas uma desarmonia no equilíbrio da criatura.

Nada cobrando pelos tratamentos, Mesmer dedicou-se principalmente a cuidar de distúrbios ligados ao sistema nervoso. Além da imposição das mãos sobre os doentes, para estender o benefício a maior número de pessoas, magnetizava água, pratos, cama, etc., cujo contacto submetia os enfermos.

Mesmer praticou durante anos o seu método de tratamento em Viena e em Paris, com evidente êxito, mas acabou expulso de ambas as cidades pela inveja e incompreensão de muitos.

Depois de cinco tentativas para conseguir exame judicioso do seu método de curar, pelas academias, é que publica, em 1779, a "Dissertação sobre a descoberta do magnetismo animal", na qual afirma que esta é uma ciência com princípios e regras, embora ainda pouco conhecida. A sua popularidade prosseguiu por muitos anos, mas outros médicos o taxavam de impostor e charlatão. Em 1784, o governo francês nomeou uma comissão de médicos e cientistas para investigar suas actividades. Benjamin Franklin foi um dos membros dessa comissão, que acabou por constatar a veracidade das curas, porém as atribuíram não ao magnetismo animal, mas a outras causas fisiológicas desconhecidas.

Concentrado no alívio à dor, Mesmer não chegou a perceber a existência do sonambulismo artificial, que seu ilustre e generoso discípulo, Maxime Puységur, descobre (inclusive a clarividência a ele associada), o qual se desenvolve durante o transe magnéticos em certas pessoas.

Em 1792, Mesmer vê-se forçado a retirar-se de Paris, vilipendiado, e instala-se em pequena cidade suíça, onde vive durante 20 anos sempre servindo aos necessitados e sem nunca desanimar nem se queixar.

Em 1812, já aos 78 anos, a Academia de Ciências de Berlim convida-o para prestar esclarecimentos, pois pretendia investigar a fundo o magnetismo. Era tarde; ele recusa o convite. A Academia encarrega o Prof. Wolfart de entrevistá-lo. O depoimento desse professor é um dos mais belos a respeito do caridoso médico: "Encontrei-o dedicando-se ao hospital por ele mesmo escolhido. Acrescente-se a isso um tesouro de conhecimentos reais em todos os ramos da Ciência, tais como dificilmente acumula um sábio, uma bondade imensa de coração que se revela em todo o seu ser, em suas palavras e acções, e uma força maravilhosa de sugestão sobre os enfermos."

No início de 1814, ele regressou para Iznang, sua terra natal, onde permaneceria os seus últimos dias até falecer em 5 de Março de 1815.

Assim foi Mesmer, durante anos semeando a cura de enfermos, doando de seu próprio fluido vital em atitude digna daqueles que sacrificam-se por amor ao seu trabalho e a seus irmãos. Suas teorias atravessaram décadas e seu exemplo figura luminoso entre os missionários que sob o açoite das críticas descabidas e as agressões da calúnia, passam incólume escudado pelo dever rectamente desempenhado. Seu nome jamais se desligará do vocábulo "fluido" e sua vida valiosa pelos frutos que gerou, jamais será esquecida por aqueles cuja honestidade de propósitos for o ornamento de seus espíritos. A sua obra foi decisiva para demonstrar a realidade da imposição das mãos como meio de alívio aos sofrimentos, tal como a utilizavam os primeiros cristãos antigamente e os espíritas actualmente.

20 maio 2008

Mesas Girantes - 3


Outra finalidade do fenómeno inicial parece ter sido afastar a descrença baseada nas teorias "magnética" e do "meio ambiente" (ou "reflectiva") que Allan kardec, ainda na sua introdução (cap. XVI) ao LE, descreve em breves linhas.

A teoria magnetica ou dos efeitos magnéticos considera que todas as manifestações atribuídas aos Espíritos não seriam mais do que efeitos magnéticos. Os médiuns, não são médiuns, apenas se acham num estado a que se poderia chamar sonambulismo desperto e em que as faculdades intelectuais adquirem um desenvolvimento anormal; o círculo das operações intuitivas se amplia, para além das raias da nossa concepção ordinária, tirando o "médium" de si mesmo e por efeito da sua lucidez tudo o que diz e todas as noções que transmite, mesmo sobre os assuntos que mais estranhos lhe sejam, quando no estado habitual.

Ora, de início, o fenómeno das mesas girantes serviu para mostrar que havia uma causa inteligente exterior ao médium, o que seria menos óbvio no caso de se ter recorrido logo à psicografia por exemplo.

Ainda assim, Kardec tece considerações que, mesmo agora no caso da psicografia, refutem esta teoria como argumento em desfavor do espiritismo (mas porém pode explicar algumas excepções de falsa mediunidade). Uma observação cuidadosa e prolongada mostrará que a intervenção do médium é a de instrumento passivo:
- se a teoria espírita é um sistema imaginado por esses mediuns "somnâmbulos" porque a teriam eles atribuído aos Espíritos?
- a falta de unidade nas manifestações obtidas pelo mesmo médium prova a diversidade das fontes. Ora, desde que não as podemos encontrar todas nele, forçoso é que as procuremos fora dele.

A teoria do meio ambiente ou reflectiva também foi afastada pelo fenómeno das mesas girantes e batedoras, o que seria menos evidente no caso da psicografia. Com o fenómeno inicial, é óbvio que a vontade do médium não intervém, e só depois se soube que apenas eram instrumentos passivos, de cujo fluido os Espíritos se serviam para mover as mesas.

Aqui ainda, prevendo as futuras dúvidas no caso da psicografia nomeadamente, Allan Kardec tece argumentos sólidos e lógicos contra esta teoria que sustenta ser o "médium" apenas a única fonte produtora de todas as manifestações, mas, em vez de extraí-las de si mesmo (teoria magnética ou sonâmbula), ele as toma ao meio ambiente, agindo como uma espécie de espelho a reflectir todas as ideias, todos os pensamentos e todos os conhecimentos das pessoas que o cercam; nada diria que não fosse conhecido, pelo menos, de algumas destas.

Certas comunicações do médium são completamente estranhas aos pensamentos, aos conhecimentos, às opiniões mesmo de todos os assistentes; frequentemente espontâneas, contradizem todas as ideias preconcebidas.

E mesmo sustentando esta teoria que se dá uma irradiação que vai muito além do círculo imediato que envolve o médium, sendo este o reflexo de toda a Humanidade, de tal modo que se as inspirações não lhe vêm dos que se acham a seu lado, ele as vai beber fora, na cidade, no país, em todo o globo e até nas outras esferas, sempre se mostra que a ideia de que os espíritos, em contacto connosco, nos comunicam seus pensamentos, nada tem que choque mais a razão do que a suposição dessa irradiação universal, vindo, de todos os pontos do Universo, concentrar-se no cérebro de um indivíduo.

Estas teorias (sonâmbula e reflectiva) foram imaginadas por alguns homens; são opiniões individuais, criadas para explicar um facto, ao passo que a Doutrina dos Espíritos não é de concepção humana. Foi ditada pelas próprias Inteligências que se manifestaram, quando ninguém disso cogitava, quando até a opinião geral a repelia.

Relata Kardec nesse capitulo XVI argumentos e factos que demonstram, na inteligência que se manifesta, uma individualidade evidente e uma absoluta independência de vontade.

Mas convém entender o porquê do fenómeno inicial e a sua subsequente substituição pelas formas mais comuns actualmente de mediunidade: as primeiras manifestações, na França, como na América, não se verificaram por meio da escrita nem da palavra, e, sim, por pancadas concordantes com as letras do alfabeto e formando palavras e frases. Foi por esse meio que as inteligências, autoras das manifestações, se declararam Espíritos. Ora, dado se pudesse supor a intervenção do pensamento dos médiuns nas comunicações verbais ou escritas, outro tanto não seria lícito fazer-se com relação às pancadas, cuja significação não podia ser conhecida de antemão.

Vale a pena ler:
"O Livro dos Espíritos",
Introdução de Allan Kardec,
Capítulos II a V, e IX.

Mesas Girantes - 2


Ainda quanto á questão da fraude, não só a caligrafia mostrava se bem diferente da escrita por alguns dos médiuns presentes, bem como muito do conteúdo cientifico, filosófico, poético ou mera gramática e linguagem até estrangeira, revelando sabedoria, pensamentos elevados e sublimes, era notoriamente fora do conhecimento e alcance intelectual dos presentes, médiuns ou outros presentes.

Também foram dadas respostas a questões colocadas mentalmente ou em idioma estrangeiro e desconhecido pelos presentes à excepção do que colocava a questão.

Ainda assim, se preciso fosse, a hipótese da fraude foi afastada pelas seguintes considerações:
- o carácter isento da pessoas presentes e a falta de interesse que teriam em simular a fraude.
- a persistência do fenómeno traduzindo-se na impossibilidade de uma fraude indefinidamente prolongada no tempo, pois seria em primeiro lugar fastidiosa para o próprio mistificador.
- inconcebível generalização da fraude em simultâneo em vários lugares do mundo, impossibilidade de um conluio mundial, de forma a obter em simultâneo, em vários lugares da Terra, os mesmos efeitos, as mesas comunicações e conteúdos das mesmas sobre assunto idêntico.
- não há fraude nem charlatanismo onde não há lucro, como é o caso.
- e quando os médiuns são crianças, como obter paciência, habilidade e conhecimento intelectual necessário destas?

E seria uma ilusão geral? O carácter de revelação da nova doutrina, o carácter simultâneo da revelação ao mesmo tempo em diversos lugares, a natureza séria e ponderada de muitos dos que estudaram o fenómeno, sem interesse em propagar erros nem fraudes, nem tempo em futilidades, é presunção favorável a afastar a ideia que os incrédulos e cépticos tenham, segundo palavras de Allan Kardec, o "monopólio do bom senso".

Essa foi a utilidade do fenómeno.
Afastar a ideia de fraude ou ilusão.

Hoje, e tendo Kardec reunido na Codificação as respostas dos Espíritos as várias perguntas filosóficas que lhes foram colocadas, o apelo é antes dirigido á razão do que à curiosidade do fenómeno, este na época (sec XIX) o B-A-BA do Espiritismo, apenas útil no inicio da revelação da doutrina pelos Espíritos.

Kardec na época, suspeitando a fraude no entanto cedo se rendeu à realidade dos factos. De Saul, virou Paulo. E nos legou a síntese dos primeiros ensinamentos pelos Espíritos da realidade do mundo espiritual através da codificação da revelação espírita inicial.

Livro dos Espíritos - 1857
Livro dos Médiuns - 1861
O Evangelho segundo o Espiritismo - 1864
O Céu e o Inferno - 1865
A Génese - 1868

Mesas Girantes - 1



No século XIX, ocorreu e generalizou-se, na América, na Europa e noutras partes do mundo, o fenómeno conhecido como "mesas girantes" ou "danças das mesas".

Pessoas sentadas a volta de uma mesa, eram surpreendidas pelo movimento inexplicado desta ou de outros objectos, por ruídos insólitos ou golpes deferidos sem que fosse compreensível, ostensiva ou conhecida a causa destes fenómenos.

O movimento dos objectos, em particular das mesas, não era um movimento circular, regular, próprio das leis conhecidas do Universo, mas antes se revelava brusco e desordenado, nunca se produzindo de maneira idêntica. A mesa e demais objectos eram sacudidos com violência, derrubados, conduzidos numa direcção qualquer e contrariando todas a leis da estática, mantidos em suspensão no ar.

Ainda assim procurou-se explicar tal fenómeno pelas leis ainda desconhecidas da física, por exemplo da electricidade então no início do seu estudo e compreensão científica.

Depressa se percebeu, quem sabe por intuição, que o movimento desses objectos não era somente o produto de uma força mecânica e cega, mas antes nele existia uma causa inteligente, revelando a existência de manifestações inteligentes que se comunicavam com os presentes através desse fenómeno próprio a atrair a atenção.

Alguns dos presentes tiveram a ideia de fazer perguntas e estabelecer um código para resposta da entidade que se manifestava através do movimento da mesa, por sim ou não, uma batida do pé da mesa para sim, duas batidas para não. Depois, motivado pelo seu cesso das primeiras respostas por sim e por não, novo código foi estabelecido: deu-se um número de ordem para cada letra do alfabeto, a manifestação respondendo pelo numero de batidas do pé da mesa, correspondendo a letra, juntando se as letras, formando palavras e frases, assim obtendo-se respostas mais completas que surpreenderam os presentes.

O ser que respondia apresentou-se como um Espírito, a alma de um homem que havia vivido tal como os presentes e que, morto o corpo físico, a este sobrevivera.

Esse Espírito então disse como obter meio de comunicação mais célere: explicou que o fenómeno dependia do fluido humano presente em maior proporção nas pessoas dotadas de mediunidade de efeitos físicos. E que atassem um lápis a uma cesta, a colocassem sobre uma folha de papel e alguns dos presentes, mais do que um, designados pelo Espírito como dotados dessa mediunidade (médium = intermediário entre o mundo físico e o mundo dos Espíritos), colocassem cada um, em conjunto, a ponta de um dedo sobre a orla da cesta. Depois substituiu se a cesta por uma prancheta.

O contacto entre os dedos dos médiuns e o objecto permitiam envolver este como o fluido, e assim, o Espírito podia manipular o objecto fluidificado, escrevendo mais rápido, dando resposta mais completas e mais céleres.

Assim também se explica a anterior manifestação das mesas e demais objectos, pela presença dos médiuns, usando o fluido mediúnico para agir sobre as mesas, os Espíritos despertaram em larga escala a atenção dos que presenciaram tal fenómeno. Nunca teriam obtido o mesmo resultado pela psicografia (o médium escrevendo directamente com a mão por influência do Espírito), pois seria mais fácil a desconfiança de se estar perante uma fraude.

Obviamente, era difícil - impossível - apenas com a ponta de um dedo, e dois médiuns colocando um dedo na cesta ou prancheta, manobrar o lápis para escrever com celeridade mensagens completas e extensas.

Sempre houve comunicações mediúnicas, a Bíblia está recheada delas, mas no século XIX generalizou se o dom da mediunidade e o intercâmbio entre os dois lados da vida. O fenómeno da dança das mesas teve a função de atrair e convencer os incrédulos, acelerando o desenvolvimento do dom da mediunidade nos que aceitaram antes de reencarnar tal tarefa de mensageiro ou intermediário do mundo espiritual: o médium.

E teve a função de despertar para sua missão o maior dos incrédulos que, suspeitando a fraude e decidido a desvendá-la, ficou conhecido pelo Codificador do espiritismo: Allan Kardec.

03 fevereiro 2008

As Religiões - A Doutrina Secreta - 2



"Se, do domínio dos factos, passarmos ao dos princípios, teremos de esboçar desde logo as grandes linhas da doutrina secreta. Ao ver desta, a vida não é mais que a evolução, no tempo e no espaço, do Espírito, única realidade permanente. A matéria é sua expressão inferior, sua forma variável.

O Ser por excelência, fonte de todos os seres, é Deus, simultaneamente triplo e uno – essência, substância e vida –, em que se resume todo o Universo. Daí o deísmo trinitário que, da Índia e do Egipto, passou, desfigurando-se, para a doutrina cristã. Esta, dos três elementos do Ser, fez as pessoas.

A alma humana, parcela da grande alma, é imortal. Progride e sobe para o seu autor através de existências numerosas, alternativamente terrestres e espirituais, por um aperfeiçoamento contínuo. Em suas encarnações, constitui ela o homem, cuja natureza ternária – o corpo, o perispírito e a alma –, centros correspondentes da sensação, sentimento e conhecimento, torna-se um microcosmo ou pequeno mundo, imagem reduzida do macrocosmo ou Grande-Todo. Eis por que podemos encontrar Deus no mais profundo do nosso ser, interrogando a nós mesmos na solidão, estudando e desenvolvendo as nossas faculdades latentes, a nossa razão e consciência.

Tem duas faces a vida universal: a involução ou descida do Espírito à matéria para a criação individual, e a evolução ou ascensão gradual, na cadeia das existências, para a Unidade divina.


(…) Este ensino abria ao pensamento perspectivas susceptíveis de causarem vertigem aos espíritos mal preparados, e por isso era somente reservado aos fortes. Se, por verem o infinito, as almas débeis ficam perturbadas e desvairadas, as valentes fortificam-se e medram. É no conhecimento das leis superiores que estas vão beber a fé esclarecida, a confiança no futuro, a consolação na desgraça. Tal conhecimento produz benevolência para com os fracos, para com todos esses que se agitam ainda nos círculos inferiores da existência, vítimas das paixões e da ignorância; inspira tolerância para com todas as crenças. O iniciado sabia unir-se a todos e orar com todos. Honrava Brahma na Índia, Osíris em Mênfis, Júpiter na Olímpia, como pálidas imagens da Potência Suprema, directora das almas e dos mundos. É assim que a verdadeira religião se eleva acima de todas as crenças e a nenhuma maldiz.

O ensino dos santuários produziu homens realmente prodigiosos pela elevação de vistas e pelo valor das obras realizadas, uma elite de pensadores e de homens de acção, cujos nomes se encontram em todas as páginas da História. Daí saíram os grandes reformadores, os fundadores de religiões, os ardentes propagandistas: Krishna, Zoroastro, Hermes, Moisés, Pitágoras, Platão e Jesus; todos os que têm posto ao alcance das multidões as verdades sublimes que fazem sua superioridade. Lançaram aos ventos a semente que fecunda as almas, promulgaram a lei moral, imutável, sempre e em toda parte semelhante a si mesma.

Mas, não souberam os discípulos guardar intacta a herança dos mestres. Mortos estes, os seus ensinos ficaram desnaturados e desfigurados por alterações sucessivas. A mediocridade dos homens não era apta a perceber as coisas do espírito e bem depressa as religiões perderam a sua simplicidade e pureza primitivas. As verdades que tinham sido ensinadas foram sufocadas sob os pormenores de uma interpretação grosseira e material. Abusou-se dos símbolos para chocar a imaginação dos crentes e, muito breve, a ideia mater ficou sepultada e esquecida sob eles. (…) O que nos vem de cima mancha-se ao contacto terrestre. Até mesmo ao seio dos templos levou o homem as suas concupiscências e misérias morais.

Por isso, em cada religião, o erro, este apanágio da Terra, mistura-se com a verdade, este bem dos céus."

(Léon Denis, "Après la Mort", 1889)

As Religiões - A Doutrina Secreta - 1



"Quando se lança um golpe de vista sobre o passado, quando se evoca a recordação das religiões desaparecidas, das crenças extintas, apodera-se de nós uma espécie de vertigem ante o aspecto das sinuosidades percorridas pelo pensamento humano.

(…) levantando-se o véu exterior e brilhante que ocultava às massas os grandes mistérios, penetrando-se nos santuários da ideia religiosa, achamo-nos em presença de um facto de alcance considerável. As formas materiais, as cerimónias extravagantes dos cultos tinham por fim chocar a imaginação do povo. Por trás desses véus, as religiões antigas apareciam sob aspecto diverso, revestiam carácter grave e elevado, simultaneamente científico e filosófico. Seu ensino era duplo: exterior e público de um lado, interior e secreto de outro, e, neste último caso, reservado somente aos iniciados.

(…) todos os ensinos religiosos do passado se ligam, porque, em sua base, se encontra uma só e mesma doutrina, transmitida de idade em idade a uma série ininterrupta de sábios e pensadores.

Todas as grandes religiões tiveram duas faces, uma aparente, outra oculta. Está nesta o espírito, naquela a forma ou a letra. Debaixo do símbolo material, dissimula-se o sentido profundo. Para conhecê-las é preciso penetrar o pensamento íntimo que lhes inspira e motiva a existência; cumpre desprender do selo dos mitos e dogmas o princípio gerador que lhes comunica a força e a vida. Descobre-se, então, a doutrina única, superior, imutável, de que as religiões humanas não são mais que adaptações imperfeitas e transitórias, proporcionadas às necessidades dos tempos e dos meios.

(…) Os sábios do Oriente e da Grécia não desdenhavam observar a natureza exterior, porém era sobretudo no estudo da alma, de suas potências íntimas, que descobriam os princípios eternos. Para eles, a alma era como um livro em que se inscrevem, em caracteres misteriosos, todas as realidades e todas as leis. Pela concentração de suas faculdades, pelo estudo profundo e meditativo de si mesmos, elevaram-se até à Causa sem causa, até ao princípio de que derivam os seres e as coisas. As leis inatas da inteligência explicavam-lhes a harmonia e a ordem da Natureza, assim como o estudo da alma lhes dava a chave dos problemas da vida.

A alma, acreditavam, colocada entre dois mundos, o visível e o oculto, o material e o espiritual, observando-os, penetrando em ambos, é o instrumento supremo do conhecimento. Conforme seu grau de adiantamento ou de pureza, reflecte, com maior ou menor intensidade, os raios do foco divino. A razão e a consciência não só guiam nossa apreciação e nossos actos, mas também são os mais seguros meios para adquirir-se e possuir-se a verdade.

A tais pesquisas era consagrada a vida inteira dos iniciados. (...) Os adeptos eram escolhidos, preparados desde a infância para a carreira que deviam preencher e, depois, levados gradualmente aos píncaros intelectuais, de onde se pode dominar e julgar a vida. Os princípios da ciência secreta eram-lhes comunicados numa proporção relativa ao desenvolvimento das suas inteligências e qualidades morais. A iniciação era uma refundição completa do carácter, um acordar das faculdades latentes da alma. Somente quando tinha sabido extinguir em si o fogo das paixões, comprimir os desejos impuros, orientar os impulsos do seu ser para o Bem e para o Belo, é que o adepto participava dos grandes mistérios. Obtinha, então, certos poderes sobre a Natureza, e comunicava-se com as potências ocultas do Universo."

(Léon Denis, "Après la Mort", 1889)

12 dezembro 2007

A reencarnação (Guilgul Neshamot) no Judaísmo: no Antigo Testamento, na Torá e na Cabala



"A Bíblia possui do Gênesis ao Apocalipse passagens sobre a Reencarnação e isto no texto original HEBRAICO.

Todo judeu ortodoxo é reencarnacionista e o é, com base na Torá que é um livro respeitado e seguido pelos judeus.

A Cabalá, ciência judaica, fala claramente da Reencarnação e ainda esclarece que a Bíblia possui 613 mandamentos e que o judeu só pode ir à Deus quando tiver cumprido todos os 613 mandamentos. E acrescenta que isto não pode ser cumprido em uma só existência. Por isso, o judeu volta várias vezes em um processo que em hebraico se chama “Guilgul Neshamot” que significa “Transmigração das Almas". É semelhante a nossa conhecida reencarnação. A diferença é que para eles, o espírito muito ruim pode retroceder e voltar como animal."

Severino Celestino da Silva(*)


(*)Professor da Universidade Federal da Paraíba, ex-seminarista, pesquisador, autor dos livros: "Analisando as Traduções Bíblicas" e "O Sermão do Monte"